domingo, 19 de maio de 2019

Em Defesa de uma Educação Qualitativa


No dia 15 de maio, alunos, professores e sindicalistas saíram às ruas para protestar contra o governo Bolsonaro por ter promovido cortes na educação federal. Mas como o próprio governo disse, não foi corte, mas contingenciamento, mas isso não importa para a ala da esquerda marxista, pois dissociar as palavras das coisas faz parte da estratégia revolucionária. Esta é uma forma de promover a barbárie como bem denunciou Mario Ferreira dos Santos, em sua obra Invasão vertical dos bárbaros: “Uma das mais tristes características de nossa época, e que já se vem processando há três séculos, e cada vez com mais acentuada insistência, é o esvaziamento das palavras dos seus verdadeiros conteúdos etimológicos e intencionais para, desse modo, ser possível mais eficientemente perturbar as consciências humanas e fazer com que a confusão, no campo das ideias, avassale todos os setores, a fim de favorecer ideias que servem a interesses inconfessáveis”.


Durante os governos de Lula e Dilma medidas como essa, quer corte, quer contingenciamento, foram adotadas, mas isso não importa para a mentalidade esquerdista revolucionária, pois eles estão acima do bem e do mal. Eles foram os eleitos pelos seus deuses (Marx, Lênin, Stálin, Lukács, Gramsci, Marcuse, Alinsky e outros tantos manipuladores de ideias) para construir um mundo melhor, não para todos (vide Cuba, Venezuela, Coreia do Norte etc.), mas para as elites, intelectual e política, que se apropriam de tudo através do Estado para proveito particular: a operação lava jato não deixa dúvidas, pelo menos para quem quer enxergar com os olhos da razão e do razoável e não com os olhos da paixão e da imoralidade.

Os insatisfeitos alegam que as universidades federais reduzirão suas produções acadêmicas com o contingenciamento, que eles nominam de corte. Mas é importante salientar que a comunidade acadêmica nacional tende a definir produtividade acadêmica como se produção de conhecimento fosse. Realmente deveria ser, mas no Brasil das universidades “politicamente corretas” e ideologicamente dominadas por um só discurso, essa sinonímia, grosso modo, não existe, pois a maioria dos trabalhos acadêmicos é desprovida de forma, justamente pela pouca capacidade intelectual dos seus realizadores, ou seja, pela pouca capacidade de apreender e manipular ideias complexas. Ademais, a maioria desses trabalhos visa propagar os interesses militantes da elite intelectual marxista-gramscista, que há mais de 30 anos impera nas universidades. Ou seja, se produz muita propaganda ideológica e menos conhecimento, pois o objeto de pesquisa não é percebido como ele é realmente, mas é ele manejado para se moldar aos interesses, às paixões e às conveniências dos seus autores. Com isso, a verdade objetiva dá lugar às verdades subjetivas, pois há uma supressão dos elementos estruturais dos objetos em prol da exaltação dos elementos estruturais dos sujeitos, especialmente os sensoriais. Não é por acaso que a realidade para esses pseudos pesquisadores é tão relativa. Também não é por acaso que os nossos professores de humanas, além de adorarem Hegel e Marx, admirem a gnoseologia kantiana, pois esta admite apenas um conhecimento ao nível das sensações, que permite, por sua vez, conhecer somente o fenômeno e nunca o númeno, ou seja, na gnoseologia kantiana não é possível conhecer a essência do objeto, mas apenas a sua aparência.

Permitam-me uma pequena digressão para explicar melhor essa questão da forma. Quando digo que um livro é um livro é porque ele contém a forma de um livro, ou seja, eu não posso dizer que um livro é um cavalo, pois aquele não possui a forma deste. Quando isso ocorre há uma falsidade lógica, como indica Mario Ferreira dos Santos, em sua obra Filosofia da afirmação e da negação. A falsidade lógica é uma não conformidade entre o ato intelectivo e o objeto formal. De forma contrária, a verdade lógica é a conformidade entre o ato intelectivo (o juízo) e o objeto formal. Na nossa realidade nacional, o desprezo pela forma se evidencia em todos os lugares (nas roupas, na arquitetura, na literatura, na música etc.). Isso se deve pela perda do senso de estilo, este, diz Richard M. Weaver, em sua obra As ideias têm consequências, “requer proporção (seja no espaço, seja no tempo), pois a proporção é o princípio regulador de uma estrutura, e esta é essencial para a percepção intelectual”. Ou seja, diferentemente da gnoseologia transcendental de Kant, o objeto não é algo que dependa exclusivamente do intelecto para ganhar uma forma, pois já possui uma estrutura independente, esta estrutura precisa ser respeitada. 
                    
Mas retornando ao propósito do artigo, não quero tratar de números ou quantidade, mas de qualidade, pois como também alertou Mario Ferreira dos Santos, em sua obra Filosofia da Crise, a ideologia esquerdista-marxista é uma “filosofia” do quantitativo, cuja tendência é “considerar os indivíduos apenas como números, como membros de uma coletividade”, tendendo a “desvalorizar o indivíduo e a valorizar apenas o componente do grupo, como o soldado, que é reduzido a um número de uma unidade, e que perde a sua personalidade ante o exército, que o considera apenas sob ângulos abstratistas”.

A crise da educação nacional não é uma questão quantitativa, mas qualitativa. Não é abrindo mais vagas nas escolas e universidades ou aumentando o número de trabalhos acadêmicos que o problema estará resolvido; não é despejando rios de dinheiro que fará da educação, uma educação melhor, mas modificando a forma de ensinar. Quando deixamos de adotar uma pedagogia mais escolástica, onde professor ensina e aluno aprende, para a malfadada pedagogia socioconstrutivista, onde ninguém ensina a ninguém, logo ninguém aprende nada, a hecatombe foi inevitável. Com esta pedagogia do “desoprimido”, os alunos também ficaram “descompensados”, onde não só deixam de saber corretamente ler, escrever, falar e realizar simples equações matemáticas, mas também de distinguir o certo do errado, o verdadeiro do falso, o real do irreal, o moral do imoral, ou seja, com essa pedagogia a perda do discernimento foi a consequência mais imediata e de proporções quase que irreversível, pelo menos para as gerações forjadas nesse modelo.
    
Em entrevista concedida a Laura Mattos, da Folha de São Paulo, publicada em 9 de maio de 2019, intitulada "Nova pedagogia cria alunos egocêntricos, afirma especialista sueca", a pedagoga sueca Inger Enkvist fez críticas ao modelo pedagógico centrado no aluno, que é o modelo socioconstrutivista e paulo freiriano adotado no país com a ascensão da esquerda marxista-gramscista. Para Enkvist a nova pedagogia se disseminou internacionalmente por um desejo da esquerda de criar um “novo homem”, sendo esse projeto tendo que iniciar com as crianças. “Pessoas que querem mudar a sociedade têm ido dar aulas e administrar escolas. A geração que entrou no campo da educação nos anos 1960 e 1970 foi muito influente. O que aconteceu é contraditório. Essa era uma geração antiautoritarismo. Contestava a sociedade autoritária, mas impôs sua própria autoridade. O que se espalhou foi um questionamento da autoridade como tradição e como aprendizado”, diz a pedagoga.

Quando questionada sobre a tendência do ensino centrado no aluno, Enkvist afirmou que essa tendência é enganosa, pois “normalmente se refere aos estudantes terem o direito de escolher o que aprender e em qual ritmo. Isso rompe a unidade da sala de aula e muda o papel do professor para alguém que precisa ter vários conteúdos diferentes para oferecer para os estudantes, os quais parecem trabalhar por conta própria. Aprendizado centrado no aluno é a solução para professores que têm que organizar o trabalho de estudantes com habilidades e interesses muito diferentes na mesma sala de aula. Porém, aprendizado eficiente é um conteúdo preparado e explicado por um professor”. Ela cita o exemplo de países como Cingapura, Hong Kong e Japão, que adotam uma pedagogia centrada no professor, que é de viés mais tradicional, e que está obtendo excelentes resultados.
      
Outra pergunta cuja reposta dada por Enkvist desconstrói uma das premissas básicas da nova pedagogia, especialmente a socioconstrutivista, é a de que se faz necessário técnicas psicopedagógicas mirabolantes para desenvolver habilidades sociais e emocionais nos alunos, favorecendo, assim, a aprendizagem. “Essa é mais uma falsa premissa. O ensino bom automaticamente desenvolve essas habilidades. Quando tudo funciona bem, o estudante no primeiro ano aprende a ser pontual, a se sentar quando deve sentar, a ouvir atentamente, a fazer perguntas educadamente, a participar em situações de aprendizado respeitando os outros alunos, a seguir instruções, a se concentrar em aprender, por exemplo, a ler, e a trabalhar de forma cuidadosa quando está aprendendo a escrever no livro de exercícios. Tudo isso é promover habilidades sociais e emocionais ao mesmo tempo em que se aprende o conteúdo. O que é um problema é quando a escola entende que ser centrada no aluno ou ser inclusiva é permitir que os alunos não sigam regras e instruções. Isso faz os alunos tão egocêntricos que, aí sim, eles precisam desse conhecimento extra de “habilidades sociais e emocionais”. 

No final da entrevista, quando perguntado a pedagoga sueca sobre a influência do politicamente correto na educação, ela argumentou o seguinte: “Se continuarmos a deixar que ideólogos ditem o que deve ser pesquisado, ensinado e dito, deixamos o campo da liberdade de pensamento que tem nos levado ao progresso. Devemos defender professores, pesquisadores e jornalistas que tentam se basear em fatos mais do que em ideologias”.

Qualquer estudioso sério na área de educação vai concordar com as respostas dadas pela pedagoga sueca e imputar ao modelo pedagógico centrado no aluno a total responsabilidade pelo fracasso educacional que hoje vivenciamos. Qualquer pessoa minimamente lúcida e desprovida de convicções ideológicas percebe que um modelo educacional que não se preocupa com a leitura, a escrita, a fala e a resolução de cálculos matemáticos, ou seja, que não se preocupa com o desenvolvimento cognitivo da criança com o fito de elevar o seu intelecto e, por conseguinte, a sua inteligência não pode ser nem considerado um modelo de educação, mas de deseducação. Mas a elite intelectual marxista vai contestar as evidências afirmando: ou que está tudo indo conforme o processo e que possíveis equívocos estão dentro do esperado; ou que o método pedagógico é eficiente, porém não está sendo devidamente aplicado.

Em suma, as manifestações do dia 15 de maio bem que poderiam ter sido em prol: do direito do professor ensinar e do aluno aprender; da despolitização da educação; do resgate da autoridade do professor e da disciplina em sala de aula; do retorno dos debates públicos nas universidades, onde as divergências intelectuais possam se manifestar livremente; da produção de conhecimento por meio de pesquisas que elevem a alta cultura, o discernimento e o entendimento dos alunos; enfim, da qualidade da educação e não, como eles insistem em defender, da quantidade de vagas, de cotas, de recursos, de trabalhos etc.

Dequex Araujo Silva Junior
Doutor em Ciências Sociais
Membro do Instituto Brasileiro de Segurança Pública
Membro fundador do Instituto Antônio Lacerda